Filme - O Xadrez das Cores





Profº Carl Lima
Redação d'O Historiante


Existe preconceito racial no Brasil? Se existe, ocorre de maneira velada ou as claras? Esse talvez seja o mote principal do curta-metragem premiadíssimo “O Xadrez das Cores”, lançado em 2004, produzido e dirigido por Marco Schiavon.  Buscando relatar a trajetória de duas personagens, aparentemente diferentes: Cida (Zezeh Barbosa) negra, meia idade, empregada doméstica, moradora de favela, alegre e Dona Stella (Mirian Pyres) branca, idosa, classe média e ranzinza. Ambas se encontram numa situação recorrente da história cotidiana brasileira, a relação trabalhista doméstica.  Nesse microcosmo marcado pelo mau humor, pelas reclamações e impaciência da patroa, as atitudes racistas saltam aos olhos.
Numa situação degradante, marcada pela necessidade econômica, Cida, mesmo mantendo a serenidade e em poucos momentos reclamando da situação, a cada quadro/cena desenvolve estratégias de negociação, permeada particularmente por um nível de conscientização.




As personagens apresentam-se como forças antagônicas: rico e pobre, o branco, o negro, a patroa, a empregada. Apesar da relação contrária existente, ambas possuem em comum a força, a determinação. Tudo isso pode ser demostrado  num raro momento de dialogo, algo apenas possível numa  relação entre iguais, em que a emoção dá o tom. Mesmo vindo de mundos diferentes, existia semelhanças entre elas, dentre as quais destaca-se: ambas eram solitárias, uma abandonada pelo marido, a outra viúva, uma teve o filho morto na favela e a outra foi obrigada a fazer um aborto.


Nesse cenário de conflito e de opressão a personagem Cida conscientiza-se da necessidade de virar o jogo. Para marcar esse processo de transformação, o diretor utiliza como recurso simbólico/imagético o Xadrez. Está aí o ponto central da obra fílmica, visto como um jogo de grande estratégia e raciocínio, reconhecido socialmente, inclusive por Dona Stella “como um jogo de Branco”. Além disso, por contar tradicionalmente com peça de cores brancas e pretas, o tabuleiro representava, através de recurso visual, uma luta racial. Se num primeiro momento, quando é desdenhada pela patroa ao pedir para jogar, sendo derrotada de uma maneira sádica, após um pedido de demissão, Cida resolve comprar um Xadrez e por conta própria aprender as artimanhas do jogo.  Após um pedido de retorno ao posto de trabalho, com a promessa de um melhor tratamento, a empregada convida, novamente, a patroa para uma partida. Isso é mais uma condicionante para sua volta. Dessa vez, uma espécie de confronto final, onde as próprias oponentes são transferidas para o tabuleiro a peleja se torna equilibrada, demostrando que conhecimento pode ser conquistado.


Está aí talvez uma das grandes lições do filme, a dita negação ao conformismo. A busca pelo conhecimento para transformação de uma estrutura imposta, como diria Franz Fanon. A consciência de si e dos problemas ao ser redor, serve como motivação para construir um novo futuro. A estrategia desenvolvida por Cida serviu como  principio, uma especie de germe de libertação de si mesmo, uma libertação capaz de mudar a sua vida.


Ao final, pouco importa quem venceu, o revanchismo não é a tônica da película. Temos como mote a denúncia do racismo  nas relações cotidiana da sociedade brasileira, mais uma obra que ataca diretamente a falsa "democracia racial", e também - para alguns um teor conservador -  a busca pelo respeito e o entendimento, capacidade humana cada vez mais esquecida em nossa práticas sociais.





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