Eu também jogaria pedra, Wadi Maswadeh.






Profº Neto Almeida
Redação d'O Historiante 



No último dia 09/07, mais uma cena lamentável chamou a atenção do mundo para a região de maior conflito do planeta: o Oriente Médio. Assistia estupefato ao vídeo abaixo que mostra uma criança de 5 anos sendo presa e depois interrogada pela polícia do Estado de Israel. O vídeo foi divulgado pela organização israelense Betselem (veja aqui).  

São cenas que mostram pelo menos seis soldados israelenses armados com um poderio bélico necessário para prender uma criança que chora desesperadamente por seu pai ou por familiares em busca de refúgio. Apesar das lágrimas do pequeno Wadi, ambos, ele e seu pai foram colocados dentro de um dos carros dos soldados e levados para um interrogatório que durou cerca de duas horas. A criança afirmou que seu alvo não era exatamente os carros do exército de Israel, mas um cachorro que passava enquanto ele brincava na rua onde mora.
As sérias acusações que caíam sobre as costas desse “criminoso” era ter jogado pedras no carro do exército de Israel. Nada demais quando analisamos a situação em que vive o povo da cidade do pequeno “vândalo”.

A cidade de Hebrom, onde o garoto mora, é conhecida como “cidade fantasma”. Advinha por quê? Desde 1997 a cidade vem sendo desocupada por moradores palestinos que deixam suas casas vazias e fecham suas lojas para viverem em outro local que não seja dominado por israelenses. Frequentemente menores palestinos são detidos. Um grave problema, porque isso fere até a própria lei do exército de Israel que permite a prisão de palestinos maiores de 12 anos e para israelenses a idade mínima de prisão sobe para 16 anos. Contudo a ação sobre o menino de 5 anos foi a primeira vez que chegou à mídia com esse tipo de ação, no mínimo, desastrosa.

A Betselem, organização israelense que trata da questão, emitiu o seguinte comunicado: “Betselem enviou um pedido urgente ao Conselheiro Jurídico em Judéia e Samaria (órgão responsável por monitorar a implementação da lei israelense na Cisjordânia), exigindo esclarecimentos sobre um incidente grave no qual soldados em Hebrom mantiveram detida por duas horas uma criança de 5 anos”. Como é informado segundo o site, Opera Mundi, que veiculou a notícia aqui no Brasil.

Não contente com a prisão e as cenas de humilhação da criança e seu pai em um interrogatório coberto de pressão psicológica, o exército israelense ainda fez os detidos sofrerem ameaças de perderem órgãos ou de serem amputadas partes do corpo, como pés, mãos e lábios.


A região da cidade de Hebrom é o único local urbano em que Israel mantém uma base de controle dentro da Cisjordânia, causando uma convivência de tumulto e insuportável tensão entre os povos palestinos e israelenses. São cerca de 170 mil moradores na cidade, contudo 30 mil vivem no eixo de atuação das tropas de Israel.

O lugar é sagrado tanto para mulçumanos como para judeus, isso explica a ocupação dessa área, pois a Tumba dos Patriarcas fica na cidade e lá estão, possivelmente, enterrados os corpos de Abrão, Isaque e Jacó, corroborando para uma intensa significação religiosa nesses lugares. Tanto os judeus como os mulçumanos reivindicam para si a posse integral da região, mas pelo visto o conflito está longe de acabar.

A ação do menino Wadi Maswadeh é não apenas a de quem não entende todo o contexto que lhe cerca, mas de quem involuntariamente, pelas condições onde habita, consegue identificar o “inimigo” bem mais próximo do que nós aqui no Brasil. Jogar pedra, pichar paredes, ou quebrar o “patrimônio público” aqui nada mais é que puro ato de vandalismo, lá é tão severo quanto aqui, contudo o inimigo é visível em todos os instantes de sua vida, aqui ele se camufla por debaixo de um discurso democrático.






Diante dos atos de manifestações no Brasil durante o último mês, meu espírito acabou sendo mais sensibilizado para perceber como redes de discursos se espalham a partir de fáceis canais de comunicação. Simples comparar a dura repressão que a criança palestina recebeu simplesmente por atentar contra a “ordem” do local onde vive, muito semelhante, aliás, ao que policiais brasileiros, armados, militarizados, fazem todos os dias aqui nas favelas, morros, bairros da periferia. Locais estes, ocupados por uma polícia armada e repressora ou em manifestações de pessoas que simplesmente jogam suas pedras por que identificam nos seus alvos todas as suas mazelas, doenças sociais e desconforto humano e recebem em troca uma truculência com a força de um exército.


Preciso doar meu apoio ao Wadi Maswadeh e dizê-lo que eu também jogaria uma pedra neles!





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