Hasta siempre, Chávez?
Prof. Pablo Michel
Magalhães
Redação d'O
Historiante
Líder bolivariano,
carismático e populista. Ditador, opressor e repressor. Vários foram os
adjetivos empregados para definir um dos presidentes sul-americanos mais
controversos da atualidade. Hugo Chávez, autor daquilo que ele mesmo intitulava
de "Revolução Bolivariana", faleceu no dia 05 desse mês e deixou
centenas de "órfãos" em sua pátria, a Venezuela. Tentando imprimir em
seu governo o que imaginava ser um Socialismo do século XXI, Chávez realizou
uma série de políticas públicas de distribuição de renda, as chamadas missões bolivarianas, num claro
intuito de beneficiar as classes mais pobres de seu país. Antiamericanista, não
perdia a oportunidade, em suas aparições públicas, de demonizar os EUA e sua
política imperialista. Ontem, com um cortejo pelas ruas de Caracas, composto
por milhares de pessoas, seu corpo (quase que um símbolo sacralizado pela massa
de seguidores) foi carregado sob “vivas” e “salves”.
Porém, seria este
realmente o "hasta siempre" definitivo para Chávez? Chavismo sem
Chávez é uma possibilidade, ou apenas uma brisa leve, logo dissipada pelos
ventos de Março? E o que seria esse tal Chavismo?
A princípio, não podemos compreender Chávez e sua ascensão sem, antes, inseri-lo no contexto histórico em que viveu. Entre 1989 e 1993, a Venezuela era governada pelo então presidente Carlos Andrés Pérez, eleito pelo partido Acción Democrática. Conhecido por ter uma posição de centro-esquerda, Pérez surpreendeu os venezuelanos com uma política de austeridade logo em seu primeiro ano de mandato. Considerado um pacote neoliberal (Pérez havia se aproximado dos EUA nesse período), previa o aumento das tarifas de transporte público, fruto da decorrente alta dos combustíveis. A revolta da população, ocorrida em fevereiro de 1989, ficou conhecida como Caracazo (por ter sido deflagrada na capital, Caracas). Pérez, utilizando-se do aparelho repressivo do Estado, promoveu um duro massacre do movimento e de seus manifestantes.
A princípio, não podemos compreender Chávez e sua ascensão sem, antes, inseri-lo no contexto histórico em que viveu. Entre 1989 e 1993, a Venezuela era governada pelo então presidente Carlos Andrés Pérez, eleito pelo partido Acción Democrática. Conhecido por ter uma posição de centro-esquerda, Pérez surpreendeu os venezuelanos com uma política de austeridade logo em seu primeiro ano de mandato. Considerado um pacote neoliberal (Pérez havia se aproximado dos EUA nesse período), previa o aumento das tarifas de transporte público, fruto da decorrente alta dos combustíveis. A revolta da população, ocorrida em fevereiro de 1989, ficou conhecida como Caracazo (por ter sido deflagrada na capital, Caracas). Pérez, utilizando-se do aparelho repressivo do Estado, promoveu um duro massacre do movimento e de seus manifestantes.
Esse episódio foi
um dos principais motores para a tentativa de golpe de Estado em 1992, liderado
pelo então tenente-coronel Hugo Chávez. Mas sua ideia de construir uma
"nova república" era algo mais antigo ao golpe, bem como ao Caracazo.
Em 1982, Chávez foi o co-fundador do Movimento
Bolivariano Revolucionário 200 (homenagem aos 200 anos de nascimento
de Simón Bolívar à época), que possuía, entre seus principais ideais, o desejo
de reformar o exército e construir, ainda que por meio de lutas, uma república
baseada nos ideais bolivarianos.
O Caracazo e o
golpe frustrado de 1992 foram responsáveis pela aparição de Chávez e a sua
consequente projeção no cenário nacional. Ao buscar encarnar os ideais de
revolução e transformação política e social, sua imagem passou a ser associada
a uma alternativa frente à corrupção do governo de Pérez. Sua prisão serviu
apenas para potencializar esses fatores. Uma vez liberto, após dois anos em cárcere, e entrando
no cenário político, o apelo populista bolivariano junto às massas surtiu o
efeito esperado por um Chávez ávido pela presidência da Venezuela.
As dificuldades encontradas pelo então presidente Caldera e a crise social, econômica e política favoreceram a ascensão de um novo personagem, sem vínculo com os partidos que disputavam o poder há tempos (a Acción Democrática e o COPEI). Este personagem era Chávez. Seus discursos encontraram eco num povo que convivia em um período de instabilidade social, muitos vivendo na miséria, e que ainda sofria com as feridas abertas no Caracazo. Em 1999, o resultado disso seria a eleição de Hugo Chávez para presidente da Venezuela.
Em 14 anos no poder, Chávez tornou-se um
representante nacional amado e odiado, e caminhou pela tênue linha da aclamação
e do repúdio no cenário mundial. Acusado de construir um regime ditatorial pela
direita, ele não ascendeu ao poder através de golpe, muito menos manteve-se no
poder à revelia do povo do país. Foi eleito pela maioria dos venezuelanos. Radical
em seu modo de agir, ele fechou grupos de imprensa opositores ao seu governo, nacionalizou
empresas estrangeiras e centralizou fortemente o poder em suas mãos. Em
contraponto, promoveu um grande desenvolvimento educacional (a UNESCO declarou
o país livre do analfabetismo) e melhorou o sistema de saúde da Venezuela.
Porém, precisamos refletir sobre o
seguinte: o “socialismo feito por um homem só” que Chávez desenvolveu, e que declarava
ser o Socialismo do século XXI, em tudo se aproxima dos escritos liberais de Max
Weber, quando este caracteriza, como um dos tipos de legitimação do poder de um
Estado, a dominação em virtude do carisma.
Sob a égide de um político carismático, de acordo com Weber, a dominação
vigente estaria legitimada e, por isso, seria considerada boa, útil, legal. Ao
assumir a presidência, promovendo a mudança da constituição e conseguindo, por
meio dela, maiores poderes, Chávez já era uma das pessoas mais influentes em
seu país. E seu carisma junto às classes mais empobrecidas acabou servindo como
respaldo necessário para que se mantivesse no poder por mais de uma década!
(Como um bom professor, não posso deixar
meus alunos “boiando”. Quem não sabe o que é liberalismo, conjunto de ideias ao
qual se opõe o socialismo, clique
aqui.)
Um contraponto merece ser feito: o
Socialismo é um sistema político e administrativo mergulhado nos escritos de
Karl Marx, que postula, dentre outras coisas, o desmembramento do aparelho de dominação (o Estado) para que,
assim, possa haver igualdade social e econômica. Por conseguinte, o Estado é o motivo pelo qual há
desigualdades. Apesar de realizar a divisão dos latifúndios e distribuir “bolsas”
para a população menos favorecida, Chávez praticava a centralização de poder e
estava consolidado na presidência há muito tempo. Uma contradição em termos.
Nisso, ele se aproxima de demais líderes populistas com apelo carismático junto
à classe trabalhadora.
Teria ele praticado a ditadura do proletariado, fase inicial, segundo Marx, da revolução
socialista? Difícil afirmar tal coisa, visto que o poder estava centralizado em
suas mãos, seria uma “ditadura de um homem só” (e ditadura é um termo que muitos chavistas repudiam). Então, que tipo
de Socialismo é esse de Chávez?
Outro elemento muito forte, utilizado por
Hugo Chávez para legitimar sua atuação e suas medidas populistas, foi a figura
de Simon Bolívar. Este revolucionário, engajado nas lutas de libertação das colônias
espanholas, foi personagem central e importante na independência de vários
países (Venezuela, Colômbia, Peru, Equador, Bolívia e Panamá). Seus escritos
forneceram bases para a construção política destas ex-colônias enquanto nações
independentes. Porém, uma vez instituído líder da Grã-Colômbia, Bolívar
imprimiu um estilo autoritário de
governo, respaldado, segundo ele, na inépcia e falta de pulso dos seus
contemporâneos em sustentar o Estado. Este líder sul-americano postulava a ideia de um Estado forte e
centralizado, algo em tudo consoante com ideais liberais e não socialistas!
O herói mítico de Chávez nada mais era que
um liberal, embevecido de ideais baseados no Iluminismo e nas revoluções
francesa e americana!
Ainda assim, há de se concordar: apesar
dos problemas econômicos, que perpassam desde a absurda inflação à queda do preço do
barril de petróleo no mercado mundial (petróleo esse que também é comprado
pelos EUA, o “diabo” particular de Chávez) principal fonte de riquezas do país em
detrimento da pecuária e agricultura, as melhorias significativas na educação,
na saúde e na distribuição de renda foram muito louváveis. O tenente-coronel
com cara de mal, mas com humor ácido e extremamente patriota, representou para
os venezuelanos uma luz no fim do túnel em uma história marcada por corrupção e
arrocho financeiro dos governos anteriores. Numa democracia de famílias
enriquecidas, o controverso Chávez promoveu uma nova lógica de governo
(socialista pra os que ainda querem assim o chamar), dando suporte às classes
menos favorecidas.
Um parêntese na minha locução: O golpe frustrado da oposição (e a covardia como foi orquestrado) forneceu mais subsídios para o aumento do carisma chavista. Pra quem não sabe, em 11 de abril de 2002, uma série de enfrentamentos pró e anti Chávez culminaram com o assassinato de várias pessoas na Ponte Llaguno. Utilizando-se de um golpe midiático, veiculado pela TV, os opositores tentaram sugerir que manifestantes chavistas teriam assassinado os membros do grupo anti-Chávez. Mais tarde, foi descoberto que franco-atiradores da oposição haviam atirado sobre os manifestantes, que apenas revidaram os tiros. Algo deplorável foi a declaração televisionada dos generais do exército, culpando Chávez pelas mortes em Ponte Llaguno. A questão é que a tal declaração havia sido gravada duas horas antes do massacre! Como sabiam eles que 6 mortes já haviam ocorrido, como consta no vídeo?
Sem sombra de dúvidas, a direita podre e corrupta venezuelana, utilizando-se de manipulações midiáticas, apenas contribuiu para que, dois dias depois do golpe, Chávez voltasse ao poder, aclamado pelos populares.
Sem sombra de dúvidas, a direita podre e corrupta venezuelana, utilizando-se de manipulações midiáticas, apenas contribuiu para que, dois dias depois do golpe, Chávez voltasse ao poder, aclamado pelos populares.
Enfim, retomo meu questionamento principal: Qual socialismo é esse de Chávez? O
Chavismo perecerá ou permanecerá? Afinal, ele praticou nada mais que um populismo do século XXI, mais responsável e menos descarado, e só. Chávez construiu sua imagem carismática junto
ao povo, mas não se preocupou em fazer o mesmo com seu futuro continuador.
Nicolás Maduro nem de longe convence.
Apenas o tempo responderá a isso.
***
Aos ávidos por conhecimento, sugiro que assistam dois documentários que falam sobre Ponte Llaguno:
"A revolução não será televisionada"
"Ponte Llaguno - As chaves de um massacre" (de longe, este é o melhor e mais completo)
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