O educador que estuda com os estudantes é mais bem sucedido que o professor que ensina aos alunos.
Redação d'O Historiante
Nossas escolas são atrasadas quando
tomamos o referencial tempo para caracterizar suas atividades. Verdade ou não a
afirmativa acima remete ao problema da educação hoje no Brasil. Em muitas
escolas, há logicamente exceções, encontramos estudantes que odeiam estar
naquele local e, por vezes, preferem estar em qualquer outro espaço, menos nas
temidas e enfadonhas salas de aula. Não é este um texto inovador, nem o
primeiro a refletir sobre a prática de ensino
predominante no Brasil. Contudo, promovo neste texto uma intensão de
problematizar o porquê de tanto repúdio ao espaço onde deveria ser por essência
um local privilegiado para vivenciar experiências numa das fases mais criativas da vida.
Começarei justamente pela criatividade.
Falta criatividade nos nossos currículos escolares. É bem verdade que há muito tempo
professores e coordenadores repetem as mesmas matérias e aulas nas salas de aula. Encontram de diferentes formas estudantes aborrecidos com tais conteúdos, sem
a menor predisposição a estudar mais uma vez as inúmeras orações coordenadas
assindéticas, por exemplo. As salas de aulas das escolas do Brasil em sua maioria ainda
repetem o esquema ordenado das salas do final do século XIX, com cadeiras
dispostas uma atrás da outra, em uma tentativa débil e insana de controlar as
ações dos estudantes. E justamente por esses absurdos anacrônicos de controle acabamos formando tão mal
os seres humanos. Educando de uma forma descontextualizada com o mundo contemporâneo.
Segundo. Acrescentados à falta de inovação
nos currículos tem-se elaborado conteúdos que não condizem com
inúmeras realidades possíveis de se encontrar na sala de aula. Por exemplo, citarei a minha área, a História. Uma das "mais fáceis" para relacionar se relacionar o conteúdo pedagógico e o cotidiano. Como tornarem importantes para um estudante as questões políticas de tantos
reinados no período moderno na Europa? A primeira pergunta que o professor
escuta ao apresentar tantos nomes de reis, políticos e pessoas distantes da
realidade daquele estudante é – por que preciso aprender sobre isso? Em
História é fácil responder tais questões, quando, depois de formados e
cheios de conceitos, respondemos enquanto professores: ‘para você entender as
condições políticas que influenciaram nossa formação’. Creio eu que o estudante
continua sem saber o real motivo daquilo. Quando não o professor responde: "Por
que vai cair na prova!". Matou o assunto, o estudante, a escola, o interesse, o
homem que se formaria.
Nossos estudos são repetitivos e pouco
conseguem empolgar uma sala inteira. Essa é a verdade. Acostumados ficamos em
saber que uma turma tem um estudante que aprende rápido a matéria decorativa e
sabe resolver o cálculo utilizando a fórmula que lhe foi apresentada no quadro
branco de forma expositiva. Mas que não sabe como usa-la na vida cotidiana. E os
outros 39 que não aprenderem sequer a utilizar a fórmula facílima que se
refere à soma dos catetos e da hipotenusa (como eu)? Terão que buscar outra área
de afinidade?
É estranho até encarar o termo estudante, utilizado aqui de propósito em alguns trechos. Essa é uma reflexão necessária e que deve ser premissa para se pensar o alvo da ação pedagógica. Utiliza-se comumente o termo aluno (o mesmo que – sem luz) para
identificar aqueles que frequentam as nossas salas antigas de aulas. Creio que
essa palavra não era para existir na escola. O termo aluno acaba indicando que os alvos da ação pedagógica são apáticos, sem brilho, sem a capacidade própria de enfrentar os problemas e
aprender a solucioná-los. Não problemas metafísicos, mas problemas reais - para
então poder voltar e aprender aquilo que não é de sua concretude.
Tratamos nossos "alunos" justamente como "alunos". Sem a menor capacidade de aprender algo por si só. Nos portamos
como detentores de uma verdade e eles de uma "burrice inata". Com desculpas pelo uso da
expressão, ofendemos o pobre animal (sempre detratado) o burro. Uma aula que se condiciona a ouvir o
que o professor diz e não aquilo que os alunos entendem deve ter algum
problema. Fico chateado quando chego a uma sala de adultos com mais de 20 anos
de idade e peço para alguém falar e a sala se põe em absoluto silêncio, ficando
apenas o sorriso discreto e amarelo lá na frente, esperando alguém iniciar. Isso
já aconteceu comigo e uma das conclusões foram: ficamos tanto tempo na escola
obedecendo a regra do faça silêncio, não fale, não converse, que quando
crescemos nos tornamos adultos que não sabemos expressar as opiniões. As vezes
nem temos uma opinião própria, ou somos pessoas que adoramos ser representadas
e nos sentimos contempladas pelo simples fato que quando crianças fomos
incentivadas a ficar calada.
Rubem Alves, um mestre na arte da escrita e da educação, uma vez falara que a
palavra silêncio não deveria existir na escola. Passei certo tempo refletindo
sobre isto. Hoje tenho uma opinião próxima à dele. Silêncio para um só
expressar e derramar seus minutos de sabedoria para uma classe de alunos que
não são estudantes? Porque ao formar uma aula para alunos e não para
estudantes formamos uma educação autoritária e bem chula, diga-se de passagem.
Entre o aluno, o estudante e o professor, passam uma boiada, velho ditado
reinterpretado por mim. Professar algo que ninguém quer ouvir é difícil. Continuar com isto por mais de 100 anos parece-nos um erro. Insistir no
ensino como se nada estivesse errado mostra que precisamos parar e repensar
nossas atividades enquanto professores,
ou melhor, enquanto educadores.
A última vez que saí da sala de aula com
um enorme prazer de ser um educador foi justamente quando menos contei a
matéria e quando mais conversei com aqueles que se propuseram a serem
estudantes naquela tarde. Não foram poucas as vezes que um círculo de conversa
com questões que pareciam distantes de sua realidade os aproximou. Interessados
em estudar e não de serem ensinados. Creio que o educador que estuda com os
estudantes é mais bem sucedido que o professor que ensina aos alunos. Qual foi
a última vez que você pensou em ser educador e largar de vez a profissão do
professor?
Talvez, minhas inquietações esbarrem nas
velhas e conhecidas condições de trabalho, nos baixos salários, no desinteresse
pela educação, dentre outras desculpas. Mas, como sempre vejo isso na História, área que me apaixonei ao
me aproximar para educar e ser educado, é preciso em todos os momentos
repensarmos nossos paradigmas, nossas certezas e estarmos sempre fazendo uma
atividade de reflexão. Fazer uma auto-crítica mesmo. Vejo mais isto na História do que na Educação.
Espero não calar a voz daqueles que se propuseram a ler este texto até o fim e
ouvir também o que teriam a dizer para este que tenta se aproximar da realidade
de tantos estudantes e educadores. Construirmos juntos novos meios de educar e
fazer escola.
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